"Happiness only real when shared."

É difícil de imaginar, mas Na Natureza Selvagem (2007) é um filme que não atinge a todos. Isso porque é um filme surpreendente, uma verdadeira odisséia assombrosa, um tipo de... oração em longa metragem.

Essencialmente, o enredo é de um jovem que, em 1990, então com 20 anos, termina uma faculdade de prestígio, vende tudo que tem, doa ou queima seu dinheiro e abandona seu carro e a família, e parte para o Alaska, em busca da verdade no caminho, inspirado por Jack London, Henry David Thoreau, Holden Caulfield e Jack Kerouac. 

Pode parecer, e é mesmo, um road movie, daqueles que mostram como uma personagem vai descobrir a vida enquanto faz uma viagem, mas aqui é muito mais um filme sobre contato, sobre conexões entre pessoas. Entre um cara que deixa pra trás pais forjados por um ideal materialista e uma irmã que dependia dele... e, sinceramente, difícil não imaginar que sua decisão foi um tanto quanto egoísta. Mas dizer "estou só" (ou algo assim, de "I'm lonely") já no final mostra que nenhum ser humano consegue abrir mão de todas as suas conexões, como ele tenta provar.

Seus pais, o casal de hippies, o fazendeiro, as pessoas que moram em trailers e o comovente encontro com o senhorzinho de quase 80 anos, que pede para adotar Chris (muito prazer). Todos eles, de certa forma, têm suas vidas mudadas pelo encontro com o jovem, mas inegável que mesmo ele tem sua vida alterada, e profundamente, em virtude de um contato com uma pessoa que desesperadoramente tenta fugir da própria vida em busca de algo melhor, mais verdadeiro, ainda que com tantas falhas que lhe custam caro demais.

E é curioso como ele parece simplesmente não se importar com raízes, no sentido de pessoas. Afinal de contas, como explicar esse senhorzinho? É de partir o coração e, mais uma vez, vem aquela sensação de egoísmo. My, myself and I, e ao mesmo tempo, Chris consegue ser incrivelmente inocente nas escolhas que faz, em relação às pessoas, porque ele realmente faz questão de compartilhar o que tem de bom a oferecer, sem amarras ou vínculos, just for the sake of it.

O filme é inspirador, mexe com o viajante que há em todos nós. Quem nunca quis, ou pelo menos pensou, em largar tudo, mudar de vida, escolher um nome novo, ou pelo menos passar alguns dias sem preocupação maior do que qual seria o café da manhã ou o jantar (nada de frutinhas estranhas, though), com um dia inteiro para se decidir? Abandonar tantas escolhas infelizes, pessoas com quem nos decepcionamos ou temos vontade de sair de perto, mas que vamos invariavelmente decepcionar, especialmente quando não merecem?

Na Natureza Selvagem é um daqueles filmes inspiradores, bonitos, e ao mesmo tempo angustiantes ao extremo, especialmente por se tratar de uma história real, que poderia ter tido um desfecho tão menos trágico (e talvez até menos inspirador, é preciso admitir) não fosse a teimosia de Chris de querer cortar todo e qualquer tipo de raíz, de ir do 80 ao 8, com erros de julgamento feios.

Mas, ao mesmo tempo, não dá pra não admirar sua jornada, sua coragem e seu espírito de investigação moral, que acabam por trazer à tona, na marra até, um pedaço de nós, que quer dominar e nos livrar do comum, do ordinário, mas pode acabar ficando naquele ônibus frio.
1 Response
  1. Defendo o Sr. Chris McCandless com todas as minhas forças, nos erros e acertos. Vamos combinar que ninguém está isento de cometer erros, de julgar, de falar antes de saber e fazer antes de pensar.
    De longe um dos filmes que me fez sair da sala de cinema chorando, desconsolada, mas preparada para tudo o que for fazer... alguém teve que errar para os outros acertarem.
    Mas vamos combinar, o Sean Penn como diretor e o Sr. Vedder na trilha sonora... casava com os dois e que me prendessem por poligamia. O que ambos fizeram foi lindo, de uma delicadeza rara, um tapa na cara daqueles que você não consegue revidar.
    O livro é bom, mas o que fizeram com o filme... maravilhoso. Mas muito me admira você só comentar sobre esse filme agora em 2012... ele vem abalando mundos há uns bons anos!