"Les temps sont durs pour les rêverus."

É praticamente impossível passar mais da metade dos 122 minutos de O Fabuloso Destino de Amélie Poulain sem um sorriso no rosto, daqueles bobos mesmo, de quando simplesmente você se sente bem, se sente feliz. E talvez essa seja a grande missão, ora ingrata, do filme, com todos os seus detalhes que, de tão ricos, são praticamente impossíveis de ser digeridos em uma assistida só. O visual do filme beira à moldura, perfeita para uma heroína de sonho como Amélie é, perfeita na pele da fofíssima Audrey Tautou. É uma experiência de sentidos o filme, e é daqueles que faz o coração sair até mais aquecido.

Uma das coisas que mais traz essa sensação de felicidade, pura e simples, é ver como Amélie, ainda que por inocência, é uma pessoa boa. A morte de Lady Di (o filme se passa em 1997) cria um efeito da Teoria do Caos, porque a morte da pincesa gera uma reação em Amélie (a tampa do perfume que cai), que leva à descoberta de um compartimento secreto e da caixinha dentro dela, com os tesouros de infância de um menino dos anos 50. Esse tesouro será o responsável pela mudança na vida de Amélie, que se torna um tipo de super-heroína, cujo poder é justamente engatilhar os eventos na vida dos outros e ajudar as pessoas, o que explica a fantasia de Zorro que ela posteriormente veste. Pois é, a foto que Nino encontra e reconstitui não é ao acaso, pra quem não entendeu. Amélie ajuda aos outros por ser uma pessoa boa, ainda que dê pra argumentar que ela o faça por ser uma forma de escapar da própria realidade ou por altruísmo, explicado pela "reportagem" que ela vê na TV sobre a própria morte. Bullshit, ou pelo menos pra mim, que prefiro acreditar que ela o faz de bom grado, mesmo que seja por inocência.



O duro, por outro lado, é justamente isso. Essa inocência ao ajudar me lembra muito o garoto Trevor McKinney (vivido por Haley Joel Osment, clone do meu primo quando mais novo), de A Corrente do Bem. Pra quem não sabe, o garoto tem uma idéia de que, se cada pessoa ajudasse três outras pessoas, o mundo seria um lugar melhor. Quem fosse ajudado teria de "passar" isso, ajudando três pessoas, que teriam, cada uma, de ajudar outras três pessoas, numa PG, e por aí vai. A idéia é simples, até, e poderia funcionar, mesmo que a gente não leve o Jim "JC" Caviezel pra casa, e ele salve uma mulher do suicídio depois. Só que Trevor tem 12 anos, e como Amélie, acredita que pode mesmo mudar o mundo, tendo até um relativo sucesso, como a trágica e linda cena final do filme mostra. Will Smith também já mostrou seu lado humanitário em Sete Vidas, que é bem bom e igualmente trágico, mas não movido por inocência, e sim por culpa, remorso ou o que for. Será que não dá pra ser movido por... sei lá, pura vontade de ajudar aos outros, ao mesmo tempo em que se pensa nos problemas no trabalho e se fala um palavrão sem motivo, por pura falta de paciência com bobagem?



Claro, são três filmes que me fizeram repetir para mim mesmo que eu não sou um cara ruim por não fazer o que eles todos fazem, especialmente porque só mesmo Amélie consegue ter bons frutos das ações, até para ela mesma, que descobre o amor no meio do caminho e protagoniza uma conquista absolutamente irresistível, que poucos filmes conseguem mostrar, dando a sensação de que uma coisa tão irreal pode ser real, ainda que seja preciso ser um sonhador para isso. Assim como se tem que ser um sonhador para fazer coisas simples como a idéia de Trevor para um mundo melhor, e precisar ter essa tal qualidade de sonhador é justamente o que está errado, porque a gente pode e deve ser simplesmente melhor, mas como pessoas normais. Não deveria ser preciso ser uma menina com a vida que Amélie teve (ela, em si, é um milagre sociológico, considerando como cresceu), ou ser um menino de bom coração que não se torna vítima da própria idéia, ou um engenheiro espacial workaholic que tem o péssimo hábito de usar o celular ao volante e acredita em (literalmente) doar a vida para que a gente acredite na natureza e na bondade humana. Mas, como dizem, a vida imita a arte e vice-versa, e talvez venha daí mesmo esse sentimento de incapacidade de se ter uma pessoa como qualquer outra que seja puramente boa, e que isso por si só nos faça felizes, ainda que com lágrimas nos olhos.


Não sei se é tão simples ser Audrey Tautou, Haley Joel Osment ou Will Smith na vida real, mas acho que é tudo uma questão de cada um tentar dentro das suas capacidades. Eu tento e, acho, sou até bem sucedido, nada de Madre Teresa. Mas dia sim, dia não, preciso me dizer que não sou um cara ruim, nem que seja cantando a música do Superguidi e me convencendo que Trevor está certo, ("I guess it's hard for people who are so used to things the way they are - even if they're bad - to change. 'Cause they kind of give up. And when they do, everybody kind of loses.") e que eu não vou ser uma das pessoas que simplesmente desistem. Algumas pessoas podem nem ligar, mas eu sinto que perco comigo mesmo, no mínimo.

"Remember me. Try your best; maybe we can."

Clementine: This is it, Joel. It's going to be gone soon.
Joel: I know.
Clementine: What do we do?
Joel: Enjoy it.



"How hard did you hit your head?"

Pois é, depois de tanto tempo, tantos alunos me enchendo o saco, tantos adultos me surpreendendo por serem fãs e de tanto Robert Pattinson pra lá e pra cá, eu fui ver Crepúsculo, a adaptação cinematográfica dos livros de Stephenie Meyer. E, confesso, esperando uma bomba, daquelas que te fazem passar o filme se mexendo na cadeira e olhando para o relógio. Foi até curioso, mas quando recebi um convite para ir ver o então por estrear Lua Nova, a continuação da saga, brinquei falando que só veria em HD e numa TV de todas as polegadas possíveis, até que umas 3 semanas atrás, isso aconteceu, assim mesmo. E essa semana agora teve a tal continuação.

O primeiro filme é dirigido por Catherine Hardwicke, que já tinha feito o interessante Aos Treze, que conta a história de (atenção!) adolescentes que descobrem o mundo adulto, sexo e drogas, aos treze anos. Já o segundo mudou de mãos, já que o diretor de Lua Nova é Chris Weitz, que tinha feito o bobo A Bússula de Ouro e o ótimo Um Grande Garoto. Isso não deveria ser muito curioso, porque estamos falando de adolescentes e adaptação de livros daquelas que geram milhares de similares ou desenterram porcarias que ganham certa projeção por tratarem do mesmo tempo. Foi assim, por exemplo, com O Senhor dos Anéis, que levou a A Bússula de Ouro, e agora a série de Meyer que gerou uma infinidade de filmes e livros de vampiros, com coisas boas e outras nem tanto. Ou seja, foram chamados os "especialistas", até porque trazer Peter Jackson seria uma piada de muito mal gosto.

Apesar do frenesi, nenhum dos dois filmes têm o calibre pra isso, nem de longe. O elenco tenta, até que é competente, mas ele se debruça horrores sobre Robert Pattinson, que é bonito mesmo, e depois no corpitcho sarado de Taylor Lautner, que passa o segundo filme praticamente todo sem camisa, numa atitude típica do nosso tupiniquim Marcos Pasquim. Só que nunca vi um povo fazer tanta de cara de prisão de ventre como Edward e Bella, os personagens principais do primeiro filme, ou mesmo as caras de "estou enfezado e sou sexy" de Jacob, no segundo filme. Só que... nem isso atrapalha. Os filmes conseguem convencer e, para minha surpresa, divertir. Bobo, mas diverte, apesar de certas partes de ambos os filmes se arrastarem a ponto de fazer a platéia sentir aquela sensação de "Vai logo, por favor?". Cheguei a pensar em Dragon Ball Z e as intermináveis lutas, mas aqui é um beijo, ou uma crise de choro, ou então aquelas cenas clichê do tipo "estamos nos conhecendo e nos apaixonando", sem os sorrisos, risadas e beijos. As cenas de ação do segundo filme, e mesmo alguns dos diálogos, fazem com que ele seja mais interessante e menos arrastado, e isso acho que é mérito de roteiro e de direção.

Bom, a verdade é que são filmes para adolescentes, sem tirar nem por. Qualquer adulto que assiste aos filmes não consegue deixar de achar os personagens infantis e bobos, sendo adolescentes que são, porque não sabem o que fazer e complicam tudo mais do que se precisa. Aqui, porque Edward é um vampiro, Bella é a menina que não se encaixa e fica com uma meia careta, e Jacob é um lobisomem que quer a pele branca e brilhante da vampirada. Só que o vampiro e a moça se apaixonam, e não podem ficar juntos. Daí, o rapaz que é o lobisomem se apaixona pela moça que acaba gostando dele também, mas não esquece o primeiro amor. O que tem de novo nisso? Nada, na verdade. Troquemos a parte de vampiros e lobisomens por ricos e pobres, cristãos, judeus e muçulmanos ou mesmo palmeirenses, corinthianos e bam-- são-paulinhos, e temos a mesma história. O interessante aqui é que não dá pra menina sair dando pros dois, sem saber quem é melhor de cama ou alguma bobagem assim, o que aumenta e bastante a coias do platonismo na relação triangular deles, e isso acaba por funcionar, até. Fica mais do que óbvia a influência de Romeu e Julieta no casal principal, e pelo menos espero que a molecada que lota os cinemas ou faz a alegria das editoras se volte ao bom Bill e suas peças, pelo menos.

Ok, eu não sei muito bem o que escrever sobre esses fenômenos. Sabe quando simplesmente você assiste e acaba gostando, em grande parte pela bomba que eu disse esperar? Mas é aquele gostando cheio de ressalvas que eu tento ignorar, ou estaria xingando o filme. Pra que falar que a construção do enredo do filme é meio tosca, e fica tudo parecendo que são questão de dias, desde a chegada de Bella à escola ao seu amor sem fim por Edward? Pra que falar que é no mínimo ridículo (ou retardado) ela continuar escrevendo os tais e-mails para Alice sendo que ela sabia que eles estavam voltando? Aquelas crises de choro que duraram meses ou os urros nos sonhos são coisas exageradas? O lance foi sentar, relaxar e gozar, seguindo conselho inestimável de nossa mamita, e deu certo. A ponto de querer ler? Não, não. Mas a ponto de querer ver o próximo, até porque a suspeita de uma coisa meio gay entre Edward e Jacob me divertiu, e quero ver como seria um casamento entre duas pessoas (ou algo assim) que se amam, só deram uns 4 beijos, se eu contei direito, e nunca foram pra cama.

Acabou que saí da casa da Maíra, e depois do cinema do Bourbon, com vontade de ver o próximo, e me perguntado ao mesmo tempo o que tinha acontecido comigo. Eu peguei gosto pelos filmes do Arnold Schwarzenegger quando era pequeno, e ele fez mesmo alguns dos marcos no seu gênero (Predador, Comando Para Matar e True Lies, por exemplo), mas pegar certo gosto pelos vampiros, Bella e os lobisomens me fez pensar se eu bati a cabeça e não me lembro.